Hoje, aos 39 anos, recordo-me de minha infância, adolescência e início da juventude como diferentes fases de relação com a espiritualidade ou religiosidade: na infância, me considerava católico, levado pela família; na adolescência, fui espírita, após um breve momento de ateísmo, tendo me dedicado firmemente ao estudo do espiritismo; como um jovem adulto, vivi a fase mais longa, marcada pelo abandono total de qualquer religiosidade e espiritualidade, e adesão completa ao ateísmo. Hoje, alguns anos depois, posso dizer que vivo uma nova fase, de redescoberta da espiritualidade, graças ao Zen Budismo e à comunidade Daissen-ji.
Minha aproximação com o Zen se deu depois que minha psicóloga, no início de 2021, me recomendou práticas de mindfulness para combater a ansiedade e o pensamento acelerado. A partir das meditações guiadas recomendadas por ela, busquei diferentes abordagens meditativas, passando pelo Yoga, pela Advaita Vedanta e a ensinamento de não-dualidade, até que acabei encontrando o Budismo na figura da Monja Coen, e fiquei particularmente atraído pela afirmação feita pela mestra de que o Budismo seria uma religião não-teísta. Busquei novas informações, o que me levou ao perfil do Instagram Sobre Budismo e, a partir das lives do Monge Butsukei com o Sensei Genshô dentro da Tutoria Sobre Budismo, descobri o Daissen e iniciei a minha prática.
O zazen veio com grandes dificuldades; era diferente de todas as práticas meditativas que eu tinha experimentado até então, ao me dizer “não se concentre em nada”, quando era exatamente o contrário do que me era ensinado até então. Insisti e, progressivamente, após longos dois meses, consegui me manter sentado na postura durante 40 minutos. Fiquei empolgado, realizei dokusans, praticava duas, três vezes ao dia, e acreditava fortemente sentir grandes efeitos oriundos do zazen.
Acreditava estar fazendo avanços substanciais e de maneira espetacular.
Meses depois, a empolgação diminuiu, percebi que os efeitos que sentia eram, em sua maioria, resultado de autossugestão e incompreensão sobre a minha própria prática. Eu quis avançar e atravessar o caminho rapidamente, acreditando-me capaz de vencer as etapas de alguma maneira prodigiosa. Hoje compreendo que o caminho se percorre em passos curtos, porém persistentes. E que ele não faz de nós nada de especial. Hoje, sinto-me comprometido com a prática e sento em zazen não com empolgação, mas com serenidade, disciplina, regularidade, buscando escapar às autoilusões e às autocobranças.
Descobri na Daissen que uma espiritualidade focada no autoconhecimento, na compaixão, no alívio do sofrimento, próprio e do outro, e não na crença em uma divindade ou força superior, é possível. Um tipo de espiritualidade que nos mostra que somos um com o todo, que sempre estivemos e sempre estaremos aqui, embora tenhamos a ilusão de início e fim. Uma espiritualidade que nos faz compreender que nossos sentimentos, pensamentos, emoções, são importantes, mas, como tudo o mais, são transitórias, impermanentes, desprovidas de uma essência e não são a nossa verdadeira realidade.
Graças à Daissen-ji, aos membros desta comunidade e, principalmente, aos Senseis Genshô e Komyô (que acompanho nas práticas do Daissen virtual), hoje, me considero um praticante zen-budista iniciante, alguém que buscava e encontrou uma espiritualidade terrena, do aqui e do agora. Hoje, entendo o Zen-Budismo não como um conjunto de normas de comportamento, ou mais uma religião da qual eu tenha me tornado um fiel e que me promete salvação após a morte, mas, sobretudo, como uma prática da compreensão profunda da minha verdadeira natureza, da integração com tudo e com todos, da dissolução da ilusão de separação. Sou grato por ter encontrado a Daissen, os seus professores e a própria comunidade que tão bem me acolhe e para qual desejo contribuir cada vez mais.
Depoimento de Uendel de Oliveira Silva. Praticante na Daissen Ji. Escola Soto Zen.