Por Uma Praticante Leiga
Em algum momento todas as pessoas questionam-se sobre o sentido da vida ou da morte, acredito que seja inerente ao ser humano essa crise existencial. Muitos encontram as respostas que procuram em religiões teístas tradicionais ou, talvez, sucumbam nas próprias ilusões e delusões. No entanto, essa angústia inquietante que nos motiva a buscar algo fora do nosso senso comum, que impulsiona a vontade de percorrer um caminho que faça sentido e aquiete nossa mente é o primeiro passo para encontramos algo além de nós mesmos.
Ao depararmo-nos com o Zen Budismo e decidirmos seguir o Caminho do Buda, podemos perceber que é algo diferente de tudo que nos foi apresentado, podemos sentir que achamos algo que vale a pena ser seguido; quando ouvimos os ensinamentos não compreendemos plenamente o que é dito, mas temos uma certeza que eles possuem as respostas às perguntas que, talvez, ainda nem pensamos em fazer.
O próximo passo no Caminho é experimentado por meio da prática contínua do zazen, ao sentar-se com diligência pode-se sentir a maravilhosa sensação obtida por meio do samadhi e kenshô; são somente vislumbres, mas o suficiente para ter certeza de que o que se busca poderá ser encontrado um dia. Como tudo no Zen, essas experiências espirituais não podem ser ensinadas, precisam ser experienciadas, não há fórmula mágica para dominar a própria mente, para isso é necessária a dedicação à prática. Nosso professor no Dharma pode atestar nossas experiências, mas não pode nos levar pela mão até elas.
Se não desistirmos no meio do caminho, podemos “agarrar” nossa mente, ainda não conseguiremos dominá-la. Nossa mente em zazen continua a viajar para o passado e futuro, não conseguimos repetir, quando queremos, a experiência de samadhi, contudo, sabemos o caminho para isso, já seguramos o boi (que é uma metáfora para mente), mesmo que seja pelo rabo.
Com a prática diligente conseguiremos amansar o boi, ou seja, aquietar a mente, mesmo que seja com esforço. Porém, o samadhi e kenshô ainda são ocasionais, pois não temos domínio total.
Se não nos perdermos no mundo de delusões e continuarmos assiduamente a nossa prática, poderemos alcançar o controle da mente sem esforços, sem amarras ou flutuações, pode-se ainda não ter controle absoluto, mas já dominamos o boi com argolas, consegue-se levar a mente de zazen também a outros momentos do dia.
No maravilho passo seguinte não vemos mais o boi, nossa mente não precisa de esforço, na verdade, não se dá mais conta da mente discriminatória, ela está em paz e não precisa mais dispender energia para controla-la, o satori instalou-se, raramente sente-se arrastado por pensamentos e emoções.
Seguindo o Caminho, o próximo passo a se experienciar é quando nossa prática se encontra com os caminhos dos budas, não há mais mente nem corpo, deixa-se de se pensar como peixe e torna-se o oceano inteiro, descobre-se plenamente a verdadeira natureza.
No penúltimo passo dessa linda jornada não há mais nada a ser pensado, não há mente nem corpo ou oceano, une-se à verdadeira natureza, encontra-se o vazio, descobre-se que o “vazio é forma e forma é vazio”.
Por fim, após todas as descobertas e experiências, resta somente o desejo de libertar todos os seres assim como libertou-se a si mesmo; se encontra presente nos lugares que homens comuns estão, trabalha-se em coisas comuns, bem como fala e ri com os outros, deseja ajudar a todos a alcançarem a liberdade de suas próprias mentes e, por conseguinte, do sofrimento. Não importa status ou aparência. A compaixão genuína e completa por todos os seres é o que move os passos daquele que se tornou um bodisatva.
Texto por Débora Muccillo. Praticante na Daissen Ji. Escola Soto Zen.