A Escola Theravada é considerada a escola mais antiga das escolas budistas sobreviventes, e por isso, chamada de escola dos antepassados ou escola dos anciões. Muitas vezes é considerada por praticantes de outras escolas como pertencendo ao veículo Hinayana ou veículo “inferior”, em comparação ao veículo Mahayana, ou Grande (Maha) veículo, de forma pejorativa, o que me parece bastante inapropriado. Eu particularmente entendo que os ensinamentos do Buddha, o Budismo em si, pode ser comparado ao Cristianismo, que possui “escolas” ou tradições tão diversas quanto o catolicismo romano, o espiritismo ou o protestantismo, todos cristãos.
O Theravada possui como seu ideal o Arhat ou Arahant, que busca a libertação do sofrimento e o Nibanna (para colocar em páli) para si mesmo. É a figura do herói solitário. Essa é uma grande distinção em relação ao Zen e a todas as outras escolas Mahayana, como o Budismo tibetano, que tem o caminho do bodhisattva como o seu ideal, a libertação de todos os seres que sofrem é o objetivo último.
O Theravada tem forte presença no sudeste asiático, sobretudo no Sri Lanka, na Tailândia, Laos, Camboja, Miammar (antiga Birmânia), mas também forte presença no Ocidente, com diversos professores bastante conhecidos na América como Sharon Salzberg, Jack Kornfield e Tara Brach, entre outros.
A prática nesta escola tem forte concentração na meditação vipassana, ou meditação do insight, termo esse que a mim parece bastante como a experiência mística do kenshô no Zen budismo, ou o enxergar a sua verdadeira natureza. A meditação vipassana geralmente é precedida por um período de concentração e acalmar da mente, conhecido como shamata. A meditação vipassana foi a origem ou precursora da hoje tão popular e tão difundida técnica de mindfulness, bastante utilizada nos dias de hoje no ambiente corporativo, por celebridades, e como técnica de redução do estresse.
Um ponto interessante de distinção entre o Budismo Theravada e o Mahayana é a virtude principal, sendo a sabedoria ou insight a principal virtude no primeiro, e a compaixão no último.
O estudo também é enfatizado fortemente no Theravada, sobretudo através da leitura dos Sutras do Cânone páli e as coleções ou Nikayas, do Sutta Pitaka. Os discursos do Buddha são considerados a fonte mais autêntica e original do Buddhismo e menos influenciadas pelas adaptações impostas pelas diferenças sociais, culturais e geográficas como no caso das escolas Mahayana. Os preceitos, as Quatro Nobres Verdades, o Nobre Caminho Óctuplo, a Atenção Plena (pelo Anapanasati Sutta) e o Dhammacakkapavattana Sutta são particularmente estudados em detalhe.
Uma característica marcante na escola Theravada é a forte predisposição monástica da Sangha, onde fica muito claro que a a vida monástica é a ideal para o alcance da libertação, e superior a prática leiga. Os bhikkhus, ou monges da tradição Theravada seguem votos monásticos mais rígidos e austeros, conforme o Vinaya Pitaka, e não podem casar-se por exemplo ou trabalhar e mantem a tradição da mendicância, a Pindapata, e uma alimentação preferencialmente vegetariana, o que não é uma constante em outras escolas mahayanas.
Nos países com predomínio da escola Theravada citados acima, os monastérios são locais de grande concentração da prática, devido a esta supremacia da prática monástica sobre a prática leiga. Os bhikkhus com seus trajes cor de açafrão, em alusão aos trajes do próprio Buddha, saem para esmolar o alimento nas cidades, formando uma longa fila laranja em busca do alimento diário. Tradicionalmente, os monges Theravada, como parte de sua prática mais austera, alimentam-se somente até o meio-dia, sendo uma refeição diária, ou eventualmente duas, sendo a última no horário do almoço, como a sangha fazia nos tempos do Buddha.
Os monastérios são presididos por um monge sênior ou um monge mais velho (maha thera) de alta posição hierárquica. As atividades organizadas dos bhikkus consistem em observar a disciplina, estudar as escrituras páli e os comentários, meditar, ensinar os noviços e executar vários serviços para os leigos. Os praticantes leigos em países theravada procuram os monges para instruções sobre os preceitos básicos do modo de vida hábil. As palestras sobre o Darma enfatizam as palavras do Buda e não a experiência pessoal. Nos países theravada, os praticantes leigos mantem pequenos santuários em suas casas, comparecem aos locais de pregação para ouvir a doutrina e participam de peregrinações a locais sagrados na Índia, Sri Lanka, Birmânia ou Tailândia. A prática leiga, embora mais distante do ideal monástico do que nas escolas Mahayana, pode chegar a níveis profundos de realização espiritual, e formar professores do Dharma, que inclusive recebem nomes do Dharma, embora eu desconheça maiores detalhes sobre o recebimento dos votos leigos, como ocorre na cerimônia de Jukai no Zen.
O principal festival religioso na escola Theravada é o Vesak, realizado na primeira lua cheia de maio, que celebra o nascimento, a iluminação e a morte do Buda. Outra celebração é a Kathina, o oferecimento de mantos e esmolas para os monges ao término da estação chuvosa em outubro. Igualmente popular nos países theravada é o festival do Ano Novo com suas procissões, água aspergida e reverências ao Buda.
No Brasil, os principais centros de prática Theravada são o Mosteiro Suddhavari, ligado a Sociedade Budista do Brasil, e sob a orientação de Ajahn Mudito, localizado em São Lourenço – MG, o Centro de Estudos Buddhistas Nalanda, com sede em Belo Horizonte – MG e seu centro de retiros Nalandarama em Brumadinho-MG, sob orientação do Profº Ricardo Sasaki, e a Casa de Dharma, localizada em São Paulo, além de grupos menores e menos organizados espalhados pelo país.
Buddham Saranam Gacchami!
Dhammam Saranam Gacchami!
Sangham Saranam Gacchami!
Texto de Marcus Vinicius Costa. Praticante da Daissen Ji. Escola Soto Zen.