Zazen: Saúde Mental e Flexibilidade

 

Não poderia começar a escrever este texto de outra maneira, pois o zazen sempre foi sinônimo de grande saúde mental na minha prática pessoal. Na primeira vez em que procurei um local de prática na minha cidade, não fazia ideia do que me aguardava, ou sobre o que se tratava a prática do Budismo, muito menos zazen. Quando cheguei e as instruções foram-me passadas, lembro-me muito bem do meu primeiro pensamento: eu acreditava que era impossível para mim ficar sentado, imóvel por tanto tempo.

A primeira coisa que aprendi, então, foi que eu era capaz de coisas que não fazia ideia que poderia fazer. Consegui realizar a prática apoiado por aquela comunidade que me acolheu (e acolhe) com tanta gentileza e amor genuíno. Lembro-me que senti muitas dores nas costas, dormência nas pernas e pensamentos muito agitados. Ainda assim, mediante a todo desconforto que um iniciante pode experimentar em uma primeira prática de zazen, eu saí de lá muito melhor do que quando eu entrei.

Geralmente é muito difícil conseguir explicar para alguém como uma prática tão desafiadora pode ser capaz de transformar a mente de uma pessoa. Não faltam pesquisas que demonstrem os benefícios que a meditação pode trazer para o corpo e a mente dos praticantes. Pensando mais a fundo sobre o porquê de a prática ser tão benéfica para a saúde, só consigo pensar que o zazen é um dos maiores remédios para as mentes que precisam de flexibilidade psicológica.

Alguns autores da psicologia clínica como Hayes, Strosahl & Wilson no livro “Terapia de aceitação e compromisso: o processo e prática da mudança consciente” publicado no Brasil em 2021, propõem que a raiz do sofrimento humano é a inflexibilidade psicológica. Essa inflexibilidade apresenta-se, principalmente, na forma de evitar-se as experiências desagradáveis. Em outras palavras, sofremos quando não aprendemos a desenvolver uma boa relação com nossos sentimentos mais difíceis como a dor, tristeza, ansiedade, melancolia e tantos outros que poderia listar.

Quando fugimos desses sentimentos, isso nos causa sofrimento, por mais paradoxal que possa parecer. Geralmente isso ocorre, pois, esses sentimentos são parte de toda a vida e acompanham, principalmente, os momentos mais significativos dela. Ter saúde mental não é apenas sentir-se bem, mas também saber acolher e encontrar abertura para viver os sentimentos mais difíceis.

E se pararmos para pensar, o zazen assemelha-se muito com toda a vida. No zazen existe dor, esforço, alegrias, tristezas e todo um universo de eventos internos que são parte de toda a vida. É impressionante que quando aceitamos, desenvolvemos uma relação melhor com as dores, os desconfortos e abrimos a mente para a experiência como um todo. Não parece mais que aquelas dores são uma barreira para alcançar o que buscamos na prática. E é assim na vida também, a velhice, doença e morte são parte dessa experiência, mas isso não significa que não podemos nos libertar do sofrimento, assim como fez Buda Shakyamuni.

O zazen é, para mim, uma grande lição sobre como podemos tirar o melhor da vida, agindo com flexibilidade em relação aos desconfortos e barreiras. É sentado que posso realmente libertar-me da dor, do desconforto mesmo (e principalmente) quando eles estão presentes. No fim, zazen é não só saúde mental e física, zazen é a própria vida.

 

Texto de Renato Oliveira, psicólogo e terapeuta clínico. Praticante na Daissen Ji. Escola Soto Zen.

 

 

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