Maipeesu é uma expressão japonesa (vinda do inglês “my pace”) que significa “pessoas que fazem as coisas no seu próprio ritmo”.
Em meio a rapidez do nosso cotidiano nos deparamos com este tipo de arte que pede justamente o inverso: paciência, tempo, calma e atenção plena para ser realizada. Certamente um grande desafio para o mundo globalizado.
Considerada como “arte têxtil”, pode ser encontrada em diversos museus. Apesar de estar sendo apontada como uma tendência em vestimenta, com sua proposta de relativa simplicidade e de sustentabilidade, favorece também um belo e marcante efeito visual.
Presentes em bolsas, vestidos, calças e tantas outras peças, as mesmas são colocadas em embalagens como costumeiramente se faz com qualquer outra mercadoria, porém, o diferencial também está na característica dessas embalagens que por si só já impressionam. Trata-se de embalagens em formato de origamis, muitas vezes pintadas em seus tecidos de maneira completamente manual. Há também o reaproveitamento de pequenos retalhos inspirados no Boro e Sashiko.
As Origens do Boro e do Sashiko
Devido aos fatores geográficos do Japão, naquela época a sua população vivia uma situação de escassez de matérias-primas. Relacionado a isso, principalmente em épocas passadas, por morarem em ilhas, as pessoas se mantinham distantes e a dificuldade de locomoção e comunicação geraram certas restrições nas relações interpessoais e de negócios. Além disso, as relações comerciais com outros países eram proibidas.
No princípio, em algumas religiões antigas do Japão, era comum pregarem a crença de que a Lua, o Sol, as estrelas, etc. eram tidos como deuses. Portanto, como estes são elementos constituintes da natureza, a mesma em sua completude era considerada sagrada. Combinando estas características: falta de elementos naturais, escassez e a sacralidade, surge o conceito denominado de “mottainai”, que simplesmente poderia ser traduzido como “nenhum desperdício”.
Sashiko (刺し子) pode ser traduzida literalmente como “pequena perfuração” ou “do tamanho de um grão de arroz”. Perfuração feita pelos diversos pontos da costura.
Originalmente era uma forma de costura de reforço que começou por uma necessidade prática, para recuperar, amaciar ou tornar a roupa mais resistente; para fazer de duas roupas gastas, uma terceira “nova”; para reforçar pontos de desgaste da roupa para enfrentar climas frios, batalhas e fogo. Com este tipo de roupa que era molhada antes de entrar em um incêndio, por exemplo, mantinha-se a mesma menos inflamável por mais tempo.
Após a origem prática do Sashiko como costura, surgiram outros elementos estéticos, criando bordados com seus estilos e padrões. Há dois estilos principais, o Moyōzashi e o Hitomezashi. No Moyōzashi o padrão é criado utilizando-se longas linhas que percorrem o tecido, e no Hitomezashi, os padrões emergem do cruzamento de linhas, formando grades.
Moyōzashi
Hitomezashi
É muito comum encontrarmos estes tipos de costuras em forma de figuras geométricas e também elementos da natureza, como nuvens, ondas, bambus, flores (cerejeira, por exemplo), libélulas, borboletas, montanhas etc.
Acompanhado do Sashiko surgiu o Boro, que pode ser considerado uma espécie de patchwork. Essa técnica usa sobras de tecidos, conectando-os com o bordado Sashiko e os transforma em travesseiros ou colchas, vestidos, casacos, bolsas, porta copos, etc.
Por volta de 1950, o Boro e o Sashiko entraram em declínio devido a popularização de fibras sintéticas, mas voltaram a ganhar espaço na década dos anos 70. Muitos artistas como Issey Miyake, Yohji Yamamato trazem conceitos em peças construídas com manipulações de tecido, assimetrias e desconstruções, misturando a essência do Boro e do Sashiko com outras técnicas.
Atualmente, Sashiko é um elemento da indústria têxtil e da moda como dito no início deste artigo. Destacamos a camisa oficial da seleção de futebol do Japão, usada na Copa do Mundo, em 2016, que trazia o grafismo do Sashiko (Figura 1). Ou seja, é inegável seu valor estético e histórico.
Figura 1- camisa seleção do Japão. Copa do mundo 2016.
A “Imperfeição” Impermanente.
O que mais encanta, certamente, é a apreciação em fazer o manual, a simplicidade que resulta numa compreensão mais aprofundada da ideia de “imperfeição”. É entender que cada tecido remendado possui uma história, abraçando a passagem do tempo e enxergando beleza na impermanência das coisas.
Em essência, é uma maneira de estender a vida ou até mesmo melhorar roupas velhas e muito desgastadas, fazer uso de seu valor intrínseco e evitar o desperdício. Essa também é uma espécie de prática de meditação, resultando em um trabalho único onde qualquer tecido que você já possui pode se tornar um trabalho especial, que é permeado por muitas histórias e reflexões compartilhadas a cada Sashiko.
Pesquisa e texto por Juliana Bacellar. Praticante na Daissen Ji. Escola Soto Zen.
Fontes:
https://www.maipeesu.com.br/
http://www.nipocultura.com.br/bordados-japoneses-sashiko-e-boro/
http://www.oblogdadmc.com/2017/07/sashiko-bordado-japones.html