O leitor e praticante Rogério Povoa da Silva nos prestigia com um relato sobre sua residência no Japão, acompanhado de belas fotografias analógicas que produziu durante sua viagem para conhecer uma estupa budista (A estupa, “stupa” é monte em Sânscrito, é uma importante forma de arquitetura budista, apesar de ser anterior ao Budismo. É geralmente considerada um monumento sepulcral, um local de enterro ou um receptáculo para objetos religiosos).
Rogério Povoa da Silva em frente ao templo Myogonji, o templo da raposa da tradição Soto-Zen, e outra fotografia do mesmo templo
Início da Jornada
O ano era 1998, já estávamos há um ano na cidade de Toyohashi, província de Aichi-ken, Japão. Sempre que tínhamos uma folga do trabalho, eu e minha esposa visitávamos os templos budistas da região para conhecê-los. Em uma noite de Yakin (trabalho noturno) estava conversando com um amigo de trabalho sobre Budismo e o mesmo comentou que na estrada Tokaido, sentido oeste, havia um templo budista para oferendas. Não pensei duas vezes, pedi mais informações, as coloquei no papel e fiz um pequeno mapa. Infelizmente o Google Maps ainda não existia, pois seria muito mais prático chegar ao local!
Sai do serviço e cheguei em casa às seis da manhã, a ideia era tomar um bom desjejum e começar a viagem. Após abastecer meu bornal com frutas e água, peguei a Eroica (bicicleta achada no lixão) e comecei a aventura, eram 6h45 da manhã do dia 06 de agosto, final do verão no arquipélago nipônico, segui pela estrada Gamagori Kaido passando pelo entorno do centro de Toyohashi, nesta região o que prevalece é um visual bem urbano. No final desta avenida parei em um pequeno templo xintoísta e tirei uma foto, já estava em percurso a uma hora e ainda não sabia quanto tempo levaria até meu destino, mais um tempo e parei em um konbini (pequena loja de conveniência muito típica no Japão) para comprar um suco, apesar do dia estar um pouco nublado, fazia muito calor e precisava de energia para pedalar, estava bem cansado pois a noite de trabalho tinha sido bem corrida, mas a vontade do conhecimento era maior.
Templo xintoísta, por Rogério Povoa da Silva
Adentrei a estrada Tokaido, neste trajeto o visual modificou completamente, as plantações de arroz e cítricas predominavam, era de uma beleza ímpar ver a região verde. Após um trecho de leve subida, quando estava descendo, avisto o topo de uma construção a uns 600 metros, meu coração deu um salto, era o topo de uma estupa. Fui me aproximando e a construção foi ficando cada vez maior e magnifica, após três horas e vinte minutos cheguei a meu destino, um local maravilhoso! Uma grande estupa budista, construída pelos camponeses da região para reverenciar o desperto.
“Eroica vislumbrando a Estupa”, por Rogério Povoa da Silva
Entrando no local, um senhor estava efetuando a limpeza do entorno, pedi permissão para tirar fotos e meditar um pouco em silêncio. Subindo as escadas, se encontrava um Buda dourado ricamente ornado, de estatuária magnífica. Fazendo a volta na estupa outro Buda, com muitas oferendas em um local fechado com vidro. Fiz uma oferenda de frutas e incenso e fiquei em silêncio.
Fotos da Estupa e do Buda Dourado, por Rogério Povoa da Silva
Após ficar um bom tempo no local fiz minha reverência a Buda e agradeci ao senhor que limpava o jardim. Atrás da estupa a mata nativa predominava, reparei que tinha uma estradinha, desci por 20 minutos em meio a vegetação e para minha surpresa me deparei com uma praia deserta, reverenciei e agradeci por fazer parte de um todo. Chegando ao fim da aventura, retornei para casa, descansei por algumas horas e fui trabalhar, naquela noite de trabalho, não havia cansaço, somente uma mente serena.
“Fim da Epopeia”, Rogério Povoa da Silva
Relato de Rogério Povoa da Silva. Praticante na Daissen Ji. Escola Soto Zen.