Sempre que me recordo da primeira vez que participei de uma prática de zazen, lembro-me da instrução de que no Zen sempre procuramos deixar as coisas como as encontramos. Aquilo foi algo que, por mais que parecesse um detalhe banal aos olhos comuns, chamou-me a atenção mais do que qualquer coisa.
Na medida em que fui avançando na prática, principalmente com uma convivência mais frequente dentro da sangha, foi possível perceber como as formas e a maneira como faziam as coisas era um treinamento para a mente. Isso ficou claro para mim quando alguém um dia disse-me, se referindo a prática do samu (prática meditativa por meio do trabalho), que quando limpamos “fora” estamos limpando “dentro”. Fui para casa maravilhado por essa constatação.
É frequente muitas pessoas não entenderem muito bem o porquê deve-se fazer as coisas de maneira constante e com pouca variação e confundem isso com apego à forma. A resposta para isso é muito simples: quando você muda o que você faz, você muda também o que existe dentro de você. Isso vai ao encontro com a proposta de psicologia estabelecida por B.F Skinner, que apostava que os fenômenos psicológicos são explicados pela maneira como uma pessoa interage com o mundo. O princípio mais básico na psicologia skinneriana é que quando agimos sobre o mundo criamos causas e consequências para o nosso comportamento e para o comportamento dos outros. Em outras palavras, os achados de B.F Skinner vão ao encontro da noção de karma que encontramos no Budismo.
Essa abordagem é muito útil, principalmente, quando pensamos no tratamento de pessoas com depressão severa. Quando nos deparamos com uma pessoa que está em um quadro dessa magnitude encontramo-nos com alguém que está apático, que abandonou os hábitos que eram comuns a sua rotina e não tem mais energia para viver. De maneira geral, uma das melhores técnicas de psicologia clínica que temos para melhorar um quadro clínico depressivo é a estratégia de organizar a rotina e o cotidiano dessa pessoa, muitas vezes recuperando práticas que antes eram habituais e hoje não são mais. Quando nossa vida está desorganizada, nossa mente também se desorganiza. Um ambiente desorganizado, sujo, sem cuidado, cria também uma mente com as mesmas qualidades.
Por esse motivo que devemos esforçar-nos para agir de maneira adequada, preocupando-nos com as causas e consequências que estamos criando e que irão afetar-nos e afetar as pessoas à nossa volta. Muito diferente de ser uma “lei do retorno”, karma está relacionado com qual tipo de mundo estamos criando quando agimos sobre ele. Se você é uma pessoa que se preocupa em criar causas que prezam pela harmonia e compaixão, por exemplo, você está criando condições para que seu contexto cultive essas qualidades na sua mente.
O caminho para uma mente mais saudável, organizada e limpa é a prática e o cultivo de hábitos que possuem essas qualidades. Experimente arrumar a cama ao levantar, mantenha sua casa organizada, seu local de trabalho, procure programar momentos de lazer e de autocuidado. Com a constância desses hábitos estará criando o ambiente propício para que sua mente seja mais equilibrada, com harmonia e saúde. Quando limpamos fora, estamos limpando dentro.
Texto de Renato Oliveira, psicólogo e terapeuta clínico. Praticante na Daissen Ji. Escola Soto Zen.